Porto Alegre/RS – Jorge e Jalete moravam há cinco anos em uma casa simples de madeira na Ilha do Pavão, na Região Metropolitana de Porto Alegre, quando, em maio de 2024, tiveram que deixar o local em razão das fortes chuvas que assolaram o Rio Grande do Sul. Essa foi a quarta enchente que o casal enfrentou na região e, quando saíram de casa, acharam que, com o fim dos temporais, poderiam retornar para recuperar seus pertences, como das outras vezes, mas dessa vez a expectativa não se concretizou. 

“A gente nunca imaginou viver algo assim. Nossa esperança era voltar e poder limpar, mas a água não baixou nunca. A água foi consumindo tudo que a gente tinha dentro de casa”, relembrou Jalete, aposentada de 58 anos.

“Eu achei que a água ia chegar a no máximo um metro, então eu fui subindo os móveis que a gente tinha dentro de casa”, contou Jorge, 61 anos, que trabalha como motorista de aplicativo. “Quando eu percebi que a água não ia parar de subir, fui embora e deixei tudo para trás”. 

Assim começou a jornada do casal por acolhimento em meio ao desastre, que deslocou aproximadamente 700 mil pessoas no estado. Juntos, o casal passou por três espaços de abrigamento até chegar ao Centro Humanitário de Acolhimento (CHA) Vida, localizado na Zona Norte de Porto Alegre, no dia 19 de julho de 2024. 

Com gestão da Agência da ONU para as Migrações (OIM), em parceria com o Governo do Estado do Rio Grande do Sul e as prefeituras de Canoas e Porto Alegre, e o programa social do SESC, os CHAs foram abertos com o objetivo de acolher pessoas desabrigadas pelas enchentes. Com capacidade de receber até 850 pessoas cada, os CHAs foram inaugurados em julho de 2024 e contam dormitórios separados para famílias e indivíduos, serviços com quatro refeições diárias, banheiros e chuveiros, lavanderia, espaço para crianças, sala multiuso, espaço pet e área de conectividade.

“Nosso acolhimento aqui foi positivo. Quando chegamos, vimos que a estrutura era melhor do que nos outros lugares, então preferimos ficar aqui”, relembrou Jorge. “Mas, claro, não é como a nossa casa”. 

Novo começo – Desde a saída da residência na Ilha do Pavão, no dia 2 de maio de 2024, quando as enchentes chegaram ao seu pico no Rio Grande do Sul, até o dia 26 de fevereiro de 2025, enquanto estavam abrigados no CHA Vida, Jorge e Jalete completaram exatos 300 dias fora de casa. A cicatriz da calamidade, no entanto, deu espaço a um novo significado, sendo substituída pelo início de um novo ciclo: naquela manhã, na sede da Caixa Econômica Federal (CEF), o casal assinou o tão esperado contrato do programa Compra Assistida, recebendo a chave do novo imóvel.  

“Eu sempre sonhei em ter um apartamento. Eu falava para o Jorge: ‘olha lá aquele apartamento à venda!’, mas nunca imaginei que esse sonho fosse se realizar”, contou Jalete. “Não foi do jeito que a gente queria, porque sofremos para chegar até aqui. Mas, agora, temos a sensação de tranquilidade, sabendo que conseguimos conquistar algo que antes parecia impossível”. 

“Quando a gente morava na ilha, a nossa ideia era ficar ali pelo resto da vida, aumentando a casa, trocando a madeira por tijolo para melhorar as condições... Depois de toda essa catástrofe, pelo menos algo bom aconteceu. Conseguimos um novo lugar, mais seguro, tranquilo”, completou Jorge. 

Estratégia de saída – A equipe da OIM está presente em todo o processo de relocação dos desabrigados pelas enchentes que foram alojados nos Centros Humanitários de Acolhimento (CHAs) seja no acompanhamento para suas novas moradias seja para o retorno às suas antigas casas quando é possível. Esse acompanhamento se dá junto à Secretaria de Habitação e com a liderança do Governo de Estado do Rio Grande do Sul. 

“Nós atuamos e acompanhamos esses trâmites para garantir que essas pessoas consigam, o mais rápido possível, dar esse grande passo rumo à reconstrução de suas vidas e tenham acesso aos seus direitos”, explicou Maria Carolina Indjaian, coordenadora da Estratégia de Saída da OIM.

Durante esta etapa final, a Organização apoia todos os acolhidos com um vale-alimentação de 3 meses e aporte financeiro para compra de mobílias básicas, conforme a composição familiar e suas necessidades.  Também são realizados mutirões de empregabilidade e cursos profissionalizantes, e atendimentos para explicar acessar seus direitos e os serviços do Estado. 

Atualmente, os dois CHAs que seguem em funcionamento, o Vida e o Esperança, ainda abrigam cerca de 470 pessoas. Até o momento, 524 pessoas já deixaram os espaços, seja para novas residências, retornando para suas casas, ou por meio de programas sociais e iniciativas de governo.